domingo, 29 de maio de 2011

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A MELANCOLIA DA ARISTROCACIA DE OUTRORA

 

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Como recordo o tempo da solidão e da incompreensão que forjava em mim a vontade quase religiosa do desprendimento e do desprezo pelas regras comuns. Como sinto a nostalgia desse tempo em que me imaginava um ser superior, diferente e tranquilamente distante. Como me lembro desse tempo maravilhoso em que o belo e as paixões atraíam os meus sentimentos e os meus pensamentos e os devaneios ardentes e sonhadores me bastavam. Esse tempo em que a vida era simples e a originalidade quase tudo para um viver pleno. O sofrimento fortuito, esse, não tinha energia para criar dor porque as ilusões atentas não o consentiam e a mágoa me era desconhecida. Hoje, velho, enfastiado e ocioso, sinto na alma a incapacidade da aristocracia de outrora e, com tranquilidade, vivo a presença de uma decadência sem chama e marcada pela melancolia. Apesar de tudo, com a mesma tranquilidade de outrora …

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sábado, 28 de maio de 2011

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A VISIBILIDADE QUE DÁ EXISTÊNCIA À INSUFICIÊNCIA DA DEMOCRACIA

 

Transgénicos

Lamenta-se não ter conhecimento suficiente da sociedade que está perto apesar de outros, sem rebuço, se permitirem mostrar o mundo que se sente e se percebe mais afastado. A encenação ganha aí o seu espaço e desproporciona-se perante a descuidada dispersão. Lasciva e com intenção, trabalham-se os palcos que importam. De modo matreiro, o visível e o invisível oferecem, nesse tempo, percepções, sentimentos e representações numa desapercebida economia da atenção. A ficção mediática esquissa, então, as realidades necessárias feitas de coisas cinicamente simples, no entanto, fixadas pela estranheza e pela opacidade. A transparência, o suposto cabouco fundamental da democracia, transforma-se docemente no seu mais previsível buraco tóxico.

Devorados pela impudica sedução do consumo, pelo desassossego de um quotidiano agitado, pelo trabalho inumano e desregrado ou, ao invés, pelas preocupações da sua escassez, mais surrados se fica pelo desmando torpe da (des)informação. Acresce, que a ignomínia insatisfeita ou insegura, reanima-se em permanência com as técnicas subliminares e eficazes de invocação da atenção que importa e interessa às proeminências sociais discutíveis. É assim que a encenação ocupa, nesta candonga bastarda, o lugar das ideologias e, deste jeito, procura a fulanização de uma suposta credibilidade que justifica o abastardamento.

 

Nesta campanha eleitoral, este fenómeno é de mais evidente. Para que tudo fique na mesma joga-se na personalização política centrada em dois rostos, encenam-se conflitualidades grupais e pessoais, teatraliza-se seduções de toda a espécie mas evita-se apresentar o que nos bastidores já se decidiu e o que na ação política concreta se pensa fazer. A promiscuidade da generalidade da comunicação social com estas teses da manipulação faz do teatro político um instrumento de poder que deprecia a democracia e desqualifica a inteligência crítica da cidadania.

Assim sendo, pior do que as marionetes centrais, na minha modesta mas enraivada opinião, confesso, são os energúmenos marginais e serventuários que desfilam nas pantalhas da televisão. Estes não fazem mais do que regurgitar, com ares aparvoados e insolentes, imitações contrafeitas demasiado previsíveis, acrescidas de trivialidades idiotas e burlescas. A esfera do mercado, e o corporativismo jornalístico a ela associada, é abusivamente invasiva perante um poder político inabilitado que tenta ocultar a sua penosa condição de gente vencida e tristemente colonizada. E assim se vai iludindo os pacóvios exibindo um tosco folclore, ao mesmo tempo que se sonegam as verdadeiras intenções e o alcance das suas duras consequências. E são estas que convêm serem esclarecidas …

Imagem obtida aqui

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sexta-feira, 27 de maio de 2011

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OBRIGADO … E ATÉ SEMPRE

 

agradecimentos 02 - POESIASMENSAGENS

Venho por este meio, que as novas tecnologias me disponibilizam, agradecer publicamente a todos os que me permitiram, pela densidade relacional, humana e social, sempre muito presente e intensamente vivida, crescer como pessoa e profissional ao longo deste caminho explorado enquanto avaliador externo, funções que exerci apaixonadamente desde 2002, no âmbito dos processos de reconhecimento, validação e certificação de competências (RVCC) e que o silêncio indesculpável da Agência Nacional (ANQ) para a Qualificação me diz ter chegado ao fim.

Entre eles, para além dos adultos a quem proximamente dedicarei um texto próprio, quero destacar os diretores, os coordenadores, os profissionais e os formadores dos respectivos Centros de Novas Oportunidades (CNO) com quem tive a alegria estimulante de partilhar perspectivas, reflexões, incertezas e paradoxos na busca perseverante de respostas necessárias e entusiasmantes na promoção sempre espinhosa e exigente desse propósito mais nobre da Educação de Adultos que é o da transformação social e do desenvolvimento inteiro das pessoas, tendo em conta a historicidade das suas realidades concretas e contextualizadas.

Aprendi com todos eles que esse propósito ético e ambicioso não constitui, bem pelo contrário, uma tarefa clara e simples e, sobretudo, se manifesta mais custosa quando as incompreensões de “estranhos”, deliberadas ou inconscientes, de maior ou menor poder, nela se imiscuem embaraçando a exigência desse desafio que se vai disputando no condicionado e persistente ajuste capaz e diário de necessidades, capacidades e expectativas dos que, em devido tempo, não tiveram a sorte histórica das circunstâncias e o reconhecimento público e político, merecido e coerentemente atuante.

Aprendi com todos eles que reconhecer hoje, mais do que remediar o não reconhecimento do passado, não é propriamente “qualificar”; é validar, equiparar, permitindo e favorecendo a formação e a qualificação futura e desejável ao valorizar, com critério, os saberes e as competências que não se esgotam e não cabem no livro escolar, a bem não só das pessoas menos escolarizadas mas também, e esse não pode ser de modo nenhum um objectivo atraiçoado, em benefício das múltiplas comunidades em que aqueles se inscrevem, a favor de um bem comum com ganhos inevitáveis para todos. Agradeço, assim, a todos os que me deram a perceber que o RVCC não oferece nada a ninguém e, coisa oposta, me fizeram compreender que o RVCC pode e deve, sobretudo, saber criar FUTURO empenhando a inteligência sofrida mas confiante dos adultos.

Agradeço igualmente o testemunho de todos aqueles que, trabalhando no campo deste reconhecimento assimilaram de desfrutada e vivida experiência e me transmitiram com inteligência e responsabilidade, a importância de provocar nos adultos menos escolarizados, com percursos profissionais de menor qualificação, a curiosidade pelo saber que alarga horizontes, o prazer pelas aprendizagens necessárias a novos sentidos aclarados, a vontade de querer saber mais para melhor significar a (re)descoberta de si, dos outros e do seu mundo e, sobretudo, me chamaram a atenção para a relevância da motivação que se renova por uma confiança reconquistada que permite e favorece os anseios legítimos e as reinvenções necessárias, próprias e colectivas.

Aprendi com todos eles que, nesta escala de ação, é isto que o FUTURO exata e primordialmente convoca; curiosidade e o gosto pelo saber, o prazer de aprender, a vontade de saber mais e mais utilmente e a motivação que alimenta a energia da confiança necessária para se ser mais ainda e de se estar mais plenamente nas esferas da cidadania que o tempo atual requer de todos nós. Reconhecer, mais do que Validar e Certificar, é criar uma condição especial e bem humana de reconciliação com o SABER, com o APRENDER e com a VIDA que nos pode ajudar a ser mais e melhores pessoas e cidadãos.

Este tempo que hoje se vive exige, como se sabe, pessoas mais informadas, mais confiantes, mais exigentes. O RVCC, indesmentivelmente, acrescenta a projetos anteriores de referência no campo da Educação de Adultos, a ideia de alargamento e expansão. Mas são aqueles a quem eu hoje aqui presto, juntamente com muitos outros, esta breve mas singela homenagem, que contribuíram com a sua disponibilidade, competência e sensibilidade para este novo ciclo nos domínios da Educação e da Formação. Saibamos, portanto, acrescentar à riqueza da herança recebida algo de verdadeiro e socialmente transformador. Um obrigado sincero a todos vós. Até sempre.

Almiro Lopes

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quinta-feira, 19 de maio de 2011

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O DESAMPARO E AS ILUSÕES ELEITORAIS

 

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Nós, os humanos, procuramos os laços sociais para nos defender dos nossos múltiplos e diferentes desamparos, sentidos, vividos ou imaginados. É a natural necessidade de proteção que nos leva ao alimento, ao afecto e ao amor. Ao longo do tempo, a natureza dessa dependência vai mudando, evoluindo do fisiológico vital para o alimento que dele transcorre para o universo complexo e humano do psicológico.

Logo, procuram-se as fontes que os desejos insatisfeitos reclamam, sejam elas religiões, mestres ou verdades, na ilusão de um qualquer acolhimento que nos transmita conforto e tranquilidade. Neste devir natural, surge então de modo dramático, um tempo cinzento em que descobrimos a insuficiência dos que nos são próximos e, em resposta a um forte apelo de sobrevivência, somos atraídos pela comodidade da oferta intrusiva de outros ideados poderes, dos deuses às teorias, na busca humana das ilusões necessárias à proteção sentida, pela sua carência, como angustiante e inconsolável.

Com o passar do tempo, a autonomia que descobrimos e desejamos passa a conflituar com as ilusões que a vida entretanto nos denuncia e, igualmente, embora de modo paradoxal, com a atração por nostalgias que nos fazem reavivar memórias em busca de um reencontro com um passado infelizmente perdido. É neste quadro de angústias que, através de construções imaginárias e simbólicas, internas ou voltadas para o exterior, os humanos procuram respostas de razoabilidade e de esperança histórica. O cinismo e a hipocrisia da argumentação política, densamente presente nesta campanha eleitoral, não eliminam – bem pelo contrário – este sentimento generalizado de desamparo em que todos nós, ou quase todos, vivemos.

Para memória futura MEMORANDO DA TROIKA

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quarta-feira, 18 de maio de 2011

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AS NOVAS OPORTUNIDADES E OS VELHOS PRECONCEITOS

 

01511A dupla Sócrates/Maria de Lurdes trataram, do meu ponto de vista, mal a educação e muito mal os professores. No entanto, não vou argumentar sobre essa realidade controversa e mais geral. Vou apenas referir-me à Iniciativa Novas Oportunidades (INO), questão aqui em apreço, tendo em atenção o que ontem pude ouvir no quadro fragmentado, e sempre simplificado, do folclore noticioso. Para descanso meu e de outros, uma nota prévia; a 5 de Junho não votarei Sócrates (“jamais”) e muito menos em Passos ou Portas. A nota prévia justifica-se porque quero afirmar, convicta e ousadamente, que a INO constituiu, talvez, a medida de política formativa mais relevante e positiva tomada pelo governo PS. Ao ouvir ontem - através da dita escolha noticiosa da sempiterna “inocência” da comunicação social - o cinismo aferrado dos interesses políticos de Sócrates, Passos, Portas e até de Carrilho, cumpre-me telegraficamente dizer o seguinte:

 

1. A INO constitui um programa diversificado que não se reduz, como muitos pensam, aos processos de reconhecimento, validação e certificação de competências (RVCC). Este dado quando omitido gera, inevitavelmente, uma confusão imprudente (baseada na ignorância) ou intencional (fundada na má-fé).

2. Assim sendo, o processo RVCC não é em si, nem pretende ser, um processo formativo ou qualificante; trata-se apenas de validar um conjunto de saberes e competências (de acordo com um referencial estabelecido) e, através dessa validação, certificar o adulto com uma determinada equivalência (escolar ou profissional) que lhe permita, e isto é que vale sob o ponto de vista humano, social e económico, inscrever-se em dinâmicas e projetos futuros de natureza essencialmente formativa e profissional (que a INO deve favorecer e/ou proporcionar) e não propriamente académica, como suspeita e receia a elite que Portas representa.

3. Certificar não é, necessariamente, qualificar. Este é o erro, involuntário ou deliberado de Passos e de Carrilho. Certificar é, neste contexto da INO e acima de tudo, conferir um passaporte para a formação/qualificação útil e necessária do adulto, nos planos pessoal, social e profissional. O conceito de educação e formação ao longo da vida, tão defendido por muitos que menosprezam o RVCC, a isso obriga. Caso contrário, esclareça-se as alternativas (concretas e não retóricas) que legitimam a depreciação mesquinha feita de uma persistência teimosa e duvidosa e de uma argumentação tão tola e primariamente elaborada.

4. Acrescente-se, no entanto, que o processo de RVCC, não tendo por centralidade a vertente formativa, não deixa de constituir um momento reflexivo de relevância na relação do adulto com os saberes, uma experiência formadora irrepetível nos domínios da autoconfiança e da motivação e, sobretudo, um espaço de descoberta que se materializa numa progressiva elaboração holística de projetos de vida assentes na importância que advém do reconhecimento social do que se sabe e sabe fazer e, com valor igual, da consciência que o próprio processo induz e possibilita de auto-reconhecimento das limitações próprias que interessam trabalhar e superar.

5. Como se pode subentender, a INO considera, na sua engenharia, entre outros dispositivos, cursos de educação e formação de adultos (EFA) que, esses sim, têm propósitos claros de formação, ou seja, de qualificação e, até, de dupla certificação/qualificação (escolar e profissional). Se essa engenharia é uma construção capaz de acolher a diversidade de realidades e públicos e a multiplicidade de propósitos (devida e claramente explicitados), é uma questão que importa avaliar social e politicamente, sem a qual se contribui para a confusão instalada que os políticos, sem pudor, disputam impudentemente em benefício próprio. Aqui, Sócrates está obrigado e esclarecer e a provar a qualidade da Iniciativa. Certificar sem criar, de modo pertinente, adequado e coerente, uma rede escalar de respostas coerentes às necessidades e expectativas geradas (pessoais e sociais) pelo processo RVCC, pode constituir um investimento megalomaníaco de retorno muito suspeitoso para não dizer criminoso. O debate político, por si, simplifica o que merecia mais honestidade e nobreza ética; as campanhas eleitorais já nem sequer simplificam … Destroem a disposição democrática dos cidadãos.

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A PUTA QUE OS PARIU OU … “PUTA QUE OS PARIU”?

 

José Saramago

«Privatize-se tudo, privatize-se o mar e o céu, privatize-se a água e o ar, privatize-se a justiça e a lei, privatize-se a nuvem que passa, privatize-se o sonho, sobretudo se for diurno e de olhos abertos. E finalmente, para florão e remate de tanto privatizar, privatizem-se os Estados, entregue-se por uma vez a exploração deles a empresas privadas, mediante concurso internacional. Aí se encontra a salvação do mundo... e, já agora, privatize-se também a puta que os pariu a todos.»


José Saramago - Cadernos de Lanzarote - Diário III - pag. 148 – texto enviado por Manuel Micaelo

Imagem retirada daqui

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segunda-feira, 9 de maio de 2011

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O desassossego da oportunidade

 

Um artigo de opinião onde se pode ler …

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Os grupos sociais que produzem as crises mantêm em geral, e salvo casos raros de colapso sistémico, a capacidade de definir a crise de modo a perpetuar os seus interesses durante e depois dela. A crise só deixa de ser destrutiva na medida em que se transforme em oportunidade nova para as classes sociais que mais sofrem com ela. E, para isso, é necessário que os termos da crise sejam redefinidos de modo a libertar e a credibilizar a possibilidade de resistência, o que implica luta social e política.

ACRESCENTO, provavelmente arrebatado, manifestando em alto e bom som, que o movimento socializador do reconhecimento do(s) indivíduo(s) e, sobretudo, do indivíduo enquanto totalidade, pode e deve inscrever em si a necessidade, e como tal, a legitimidade humana e moral das lutas social e política. Um crime de roubo, facilmente se reprova porque o direito à propriedade, sagrado que é, foi amputado. E os crimes contra a dignidade e a integridade das pessoas? E onde estão eles, esses criminosos, muitos dos quais se passeiam pelos ecrãs das nossas televisões? Tenho para mim que a cidadania, e o sentido de humanidade que a engrandece, através da indignação ativa e consequente, constitui um pilar essencial à criação de relações de reconhecimento eticamente amadurecidas, pressuposto insubstituível na (re)construção efetiva de uma comunidade justa e solidária feita de cidadãos livres. Para mim, com toda a sinceridade o afirmo; há muitos criminosos da fato e gravata em liberdade … para mal do BEM COMUM !

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sexta-feira, 6 de maio de 2011

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UM PALPITE - VENHA A CONFIRMAÇÃO …

 

Em Março de 2007, especulava-se já sobre o sucessor para Carvalho da Silva. O próximo congresso está cada vez mais perto. Aqui vai o meu palpite. Apresento-o a quem anda muito distraído ou desinteressado. Um homem de convicções, sereno, mas de uma assertividade acima do comum. Os “poderes instituídos” que se cuidem. As aspas significam. Temos HOMEM para “eles” ….

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quinta-feira, 5 de maio de 2011

UM AGRADECIMENTO

 

Este quadro não veio diretamente da ACADEMIA DOS INCAMMINATI (encaminhados) mas pintado por MARIA CÂNDIDA LOPES, a quem solicitei a obra. Trata-se de um pormenor - o menino que rema - do quadro “Sermão de São João Baptista”, de Ludovico Carracci.

Ludovico Carraci, que foi diretor da Academia dos Incamminati, “tornou-se o principal intérprete das ideias expressas pelo cardeal Gabriele Paleotti no Discurso Sobre Imagens Sacras e Profanas, no qual se insistia no poder comunicativo das imagens sacras e se evidenciava a necessidade de uma política de controlo sobre os conteúdos expressos”. É nesta perspectiva que Ludovico evita as “complicações tardo-maneiristas de difícil compreensão para o povo”, procurando “uma pintura simples que exprimisse com clareza os conteúdos sacros”. Desta escola saíram todos os grandes representantes da pintura bolonhesa do século XVII, de acordo com A GRANDE HISTÓRIA DA ARTE, edição do jornal Público.

À Maria Cândida o meu reconhecimento e aqui fica o seu email para quem a quiser contactar: didita.lopes@gmail.com

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A VELOCIDADE DA TRANSGRESSÃO

 

Não sou um condutor exemplar, confesso. No entanto, acrescente-se, mais por razões de competência em matéria de condução do que propriamente por incumprimento exigente do dever de cidadania no que às regras de trânsito diz respeito. O que costumo dizer aos amigos, é disso expressão metafórica e significativa; que apenas receio as armadilhadas como as dos limites de velocidade 50 que nos aparecem quando menos se espera e que a descontração de uma condução responsável, apesar da sua “inadimplência”, possa virar crime.

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No entanto, se este aspecto merece alguma preocupação pela perplexidade do seu desproporcionado carácter normativo, por muitos exaltado, para mim o 50 faz todo o sentido pelo seu valor indicativo cujo respeito deve ser naturalmente vigiado, tendo em conta os distintos contextos em que o dito sinal cumpre a sua função. Se este raciocínio não é de todo despropositado, o problema passa a ser, não o do respeito rigoroso pelo 50, mas o da conflitualidade das definições moral e normativa da transgressão. E é aqui que o irrisório me parece que acontece por força de conveniências por vezes absurdas e inconfessáveis e dos múltiplos testemunhos que suportam estes julgamentos e suspeitas.

Nesta perspectiva, que é hoje, em função de circunstâncias singulares, particularmente interessada, não no sentido da desculpabilização pessoal mas da razoabilidade do sentido ético e comunitário, não posso deixar de referir e distinguir o conteúdo das diversas contra-ordenações que o Código prevê, nomeadamente aquelas que, inequivocamente, são consequência de incivilidade e de irresponsabilidade notórias e outras, como esta dos 50, em que a percepção generalizada  - e considerável - das realidades atrapalha claramente a bondade e a justificação normativas. A lei, ao atender (e não a ocultar) estas suas fragilidades, desperta no cidadão a reconciliação com ela por que expressa a reciprocidade relacional do reconhecimento mútuo, necessária à compreensão da estrutura que a causa e motiva. Não se forje uma eticidade formal que avilte a acuidade da eticidade natural.

Em suma, se o espírito de perseguição me acossasse, diria que a polícia não gosta mesmo de mim …

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